A independência do auditor e a mudança voluntária da empresa de auditoria externa

Resumo: A separação entre propriedade e gestão abordada pela Teoria da Agência mostra os problemas relacionados à assimetria de informações entre gestores e acionistas (JENSEN; MECKLING, 1976). O acionista, separado da gestão da empresa, demanda informações que o assegurem que seu capital está sendo investido de forma a lhe garantir o maior retorno no longo prazo. A transparência da gestão da empresa é considerada um dos pilares da governança corporativa pelo Instituto Brasileiro de Governança Corporativa (IBGC, 2009).
Os demonstrativos financeiros e o relatório da auditoria independente são elementos fundamentais na comunicação da empresa com seus investidores e o mercado como um todo. A independência da empresa de auditoria externa garante ao investidor que as informações prestadas são fidedignas e refletem a real situação da empresa. Entretanto, os escândalos corporativos nos EUA nos anos 90 mostraram falhas no papel exercido por grandes firmas de auditoria. As explicações envolvem o comprometimento à independência da auditoria externa através de relacionamento entre os executivos das empresas, longo período de prestação de serviços e extensão dos contratos a serviços extra-auditoria.
A preocupação com os efeitos da perda de independência do auditor movimenta os ambientes regulatórios dos países. A SEC (Security and Exchange Comission) dos EUA, em novembro de 2000, proibiu a prestação de certos tipos de serviço extra-auditoria e exigiu a abertura dos valores pagos aos serviços de auditoria e serviços extras a partir de fevereiro de 2001. Em 2002 o órgão proibiu nove tipos de serviços extra-auditoria e passou a exigir a aprovação prévia dos escopos dos contratos pelos comitês de auditoria das empresas (MITRA; HOSSAIN, 2007).
No Brasil, a CVM através da Instrução 480/09 cria um novo relatório a ser divulgado pelas empresas, o Formulário de Referência (FR), e exige a divulgação dos valores pagos às empresas de auditoria externa pela prestação dos serviços de auditoria em separado dos valores referentes a outros serviços (CVM, 2009). As atribuições legais do Conselho de Administração (CA) também o tornam elemento importante na preservação da independência da auditoria. A Lei n. 10.303/2001 estabelece em seu art. 142, que entre as atribuições do CA estão a escolha e destituição da empresa de auditoria externa (“Lei n. 10.303/2001”, 2001). O ambiente regulatório brasileiro, através da Instrução CVM 308/1999, também determina o rodízio das empresas de auditoria a cada 5 anos no mínimo, e estabelece um prazo de 3 anos para a recontratação (CVM, 1999). O rodízio obrigatório busca diminuir o risco da perda de independência que pode resultar do longo prazo de relacionamento entre as partes.
Quanto às mudanças de empresas de auditoria Johnson e Lys (1990) apresentam o argumento de que a contratação de uma nova empresa de auditoria pode estar motivada pela busca de um fornecedor mais “flexível” e capaz de acomodar as necessidades do cliente.
Johnson e Lys (1990) mostram que as empresas que trocam de auditor externo apresentam pior desempenho econômico e de preços de ações. Mas não há retorno anormal das ações após a divulgação da mudança.
Hudaib e Cooke (2005) analisam as interações entre a mudança do principal executivo da empresa, o stress financeiro e a mudança da empresa de auditoria. Os autores encontram que a probabilidade de mudança da empresa de auditoria aumenta após a emissão de ressalvas em relatório, e essa chance aumenta com a severidade da ressalva. Essa relação sugere que a expectativa sobre o novo auditor seja uma menor chance de emissão de ressalva. A mudança em posições chave na empresa cliente também altera a probabilidade da empresa de auditoria ser substituída. A pesquisa conclui que há efeitos, no Reino Unido, tanto de fatores relacionados à familiaridade com a empresa de auditoria quanto de intimidação. Nazri, Smith e Ismail (2012) também encontram, em análise na Malásia, efeitos da mudança na gestão sobre a troca do auditor independente.
Os trabalhos descritos a seguir, desenvolvidos quase que totalmente no mercado americano, mostram a diversidade na definição de como avaliar a independência e no conjunto de variáveis que buscam explicar seu comportamento. A independência é avaliada por métricas contábeis tais como: conservadorismo e accruals discricionários e também pela análise dos relatórios da auditoria e a emissão de ressalvas. As motivações para a troca do auditor investigam variáveis econômico-financeiras, práticas contábeis e mudanças na alta gestão.
Em relação à prestação de serviços extra-auditoria, Defond, Raghunandan e Subramanyam (2002) explicam que a perda da independência é o resultado de duas forças com sentidos opostos. A primeira seria a preocupação com a reputação da firma de auditoria, o que resguardaria a independência. Em sentido contrário estaria o incentivo da empresa de auditoria em vender mais serviços ao cliente aumentando a chance de retê-lo por mais tempo. Essa segunda força tende a aumentar a dependência financeira de um mesmo cliente, e compromete a capacidade de auditar de forma independente o resultado de ações sugeridas pela própria auditoria em trabalhos de consultoria. Os autores aproximam a perda de independência pela probabilidade do relatório da auditoria apresentar ressalvas. A análise em 944 empresas americanas em 2001 sob “stress financeiro” não mostra relação entre a prestação de serviços extra-auditoria e a propensão a emitir ressalvas no relatório de auditoria. A seleção de empresas sob “stress financeiro” é justificada porque neste grupo se esperaria maior incidência de ressalvas quanto à situação financeira das empresas cliente.
Frankel, Johson e Nelson (2002) observam a relação entre serviços extra-auditoria, lucros anormais e accruals discricionários e encontram sinal positivo, evidenciando que empresas que contratam serviços extra-auditoria são mais gerenciadoras de resultados. Entretanto, Skaife, Lafond e Mayhew (2002) contestam o trabalho anterior mostrando a ausência de relação quando os accruals discricionários são ajustados ao desempenho da firma.
Larcker e Richardson (2003) também não encontram relação entre accruals discricionários e serviços extra-auditoria. Entretanto, para um subconjunto de empresa parece haver relação positiva. Neste subconjunto parece haver maior controle por membros internos da empresa, evidenciado por variáveis tais como menor percentual de membros independentes no CA, maior participação acionária de membros da gestão, CAs menores e menor participação de investidores institucionais.
Ruddock, Taylor e Taylor (2006) não encontram evidências de que a contratação de serviços extra-auditoria tenha relação com um menor grau de conservadorismo. Esses resultados mostram o efeito dominante da preocupação com a perda de reputação da empresa.
Os trabalhos sobre serviços extra-auditoria não são conclusivos quanto à perda de independência, entretanto, a possível relação entre essa prática e a troca da empresa de auditoria merece análise. A maior dependência da auditoria em relação a um cliente que gera grande faturamento inibe a independência e a chance de emitir ressalvas, o que pode deixar o cliente mais satisfeito reduzindo o incentivo para a troca do auditor. A relação dos valores cobrados pelos auditores e a substituição dos mesmos é analisada por Simon e Francis (1998) que mostram que a busca por menores valores pode motivar a substituição. Os autores encontram redução nos valores cobrados nos quatro primeiros anos, entretanto, após isso há elevação nos valores. Butterworth e Houghton (1995) chegam a resultados coerentes com estes achados.
Os estudos anteriores mostram a concentração no mercado americano. Estudos relacionados ao tema no Brasil ainda são poucos. Apenas a partir da Instrução CVM 480/09 as empresas passaram a ser obrigadas a informar os valores pagos às empresas de auditoria independente a título de serviços de auditoria e outros serviços. No Brasil, Azevedo e Da Costa (2012) observam o efeito da troca de empresa de auditoria sobre o gerenciamento de resultados e concluem não ser possível afirmar que o rodízio de auditores aumenta a qualidade da informação contábil.
Assim, o presente projeto de pesquisa visa contribuir para a literatura a respeito dos fatores motivadores para a mudança da empresa de auditoria externa e a independência dos auditores. O momento é oportuno uma vez que a divulgação obrigatória das informações sobre os valores dos serviços extra-auditoria ocorre em 2013 pela quarta vez, o que permitirá, a partir de um maior volume de observações, maior robustez às análises estatísticas e a observação da evolução dos valores.
Assim a pergunta de pesquisa que se coloca é: que fatores afetam a decisão de mudança voluntária da empresa de auditoria e como a mudança afeta a imparcialidade do parecer?

Data de início: 01/07/2013
Prazo (meses): 24

Participantes:

Papelordem decrescente Nome
Coordenador PATRÍCIA MARIA BORTOLON
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